Um estranho fenômeno acontece com as mulheres que fazem plástica, especialmente as de seios. Após o “conserto”, elas são tomadas por uma euforia e um exibicionismo sem precedentes; se exibem despudoradamente, como se aqueles novos adereços não fizessem parte da sua anatomia.
Já tive inúmeras oportunidades de encontrar com amigas que, sem mais aquela, alegremente levantavam a blusa, com um olhar matreiro e disparavam:
– Menina, nem te conto, fiz plástica, botei silicone. Olha só como ficou! Nem se nota a cicatriz!
E eu quase sempre me assusto, diante daquele “ataque dos seios perfeitos”. Eu nem perguntei nada, mas a necessidade de mostrar a aquisição vai além dessa questão insignificante.
Mas ontem, as coisas fugiram de controle:
Aqui, na esquina de casa, tem uma drogaria onde costumo comprar o meu “kit sobrevivência de velha”. Ela é muito frequentada por senhoras ricas, viúvas de juízes, militares.
Algumas querendo resgatar o tempo perdido em casamentos que fizeram Bodas de Ouro de chatice. Outras, na esperança de ainda encontrarem um parceiro de vida no inverno de suas existências.
E elas se encontram nesse balcão para longos papos sobre cremes antirrugas, novidades para combater a diabetes, comparam as suas taxas de colesterol e triglicerídeos. Foi numa dessas que encontrei uma adorável senhora na faixa dos 70 e vários. Muito falante, professora aposentada e viúva, entrou íntima, cumprimentando todos e dizendo:
– Alguém sabe o novo nome do Pezão? É Maozão! E todos riram menos eu, em vibe rabugenta.
Mas, parece que Deus castiga e a senhora olhou para a minha cara e imediatamente passou a falar olhando direto para mim.
Não tive alternativa senão relaxar e prestar atenção.
Atenção??????
Meu pai me ensinou uma técnica infalível para lidar com essas situações. Olho para um ponto distante, acima da cabeça do meu interlocutor, faço cara de paisagem, leve sorriso nos lábios e
…..não ouço nada! Às vezes balanço a cabeça levemente, para dar a impressão de que estou achando o máximo.
E foi assim.
Após recolher os medicamentos, me dirigi a senhora para um boa tarde e peguei um fragmento da conversa onde ela dizia:
– Pois é, depois da minha cirurgia, não posso levantar os braços
por três meses…..
Jesus! Que horror! A pobre falando de cirurgia e eu nem ai?
Coitada, deve ter retirado o seio. Uma culpa se apossou de mim.
Olhei para ela e disse:
– Mas a senhora já está passando bem? Ela, com seus alegres olhinhos azuis respondeu:
– Não, minha filha, eu não tive câncer, fiz cirurgia de redução dos seios e implante de silicone. Estavam horríveis! A senhora
conhece aquele peito pera?
– Hum?
– É peraqui, respondeu às gargalhadas apontando a própria cintura.
Dai em diante, ela me seguiu rumo a fila dos caixas, relatando a sua peripécia. Fique sabendo o nome do médico, onde ficava, em que hospital havia operado, como estava feliz e, pasmem! Que estava sem sutiã – A senhora não reparou?
Quando finalmente chegou a nossa vez, pagamos, ela em um e eu em outro caixa, sai depressa, com ela no meu encalço. Não contente, segurou no meu braço e disse:
– Eu moro bem ali, naquele prédio amarelo com toldo. Quando compramos, recebia o sol da manhã, mas agora, construíram aquele grandão em frente.
Me resignei. Fiquei ali na porta da farmácia esperando que a senhora terminasse o seu discurso e até senti uma pontinha de solidariedade. Coitada, deve estar solitária, pensei.
Foi quando reparei que ela estava com os primeiros botões da
blusa verde desabotoados. Mais que depressa, lembrei:
– Sua blusa está aberta.
E ela:
– Ah, é que eu fui mostrar para a Cléo (a balconista) como ficou a
cirurgia e esqueci de abotoar. Aliás, deixa eu mostrar para a senhora que trabalho lindo.
E diante dos meus olhos incrédulos, abriu a blusa! Sim, ela abriu
a blusa bem ali, na porta da farmácia, num dia claro e movimentado, expondo um seio branquinho, com aréolas cor de rosa e aspecto de virgem. Uma cicatriz quase imperceptível
circundava o bico do seio. Juro, quis morrer. Não por vergonha, mas por não poder rir até o século 22. Era tão surreal, que parecia coisa saída de uma cena de Felini.
Rapidamente me despedi da senhora, olhando para os lados, pensando se alguém mais estava olhando aquela cena inacreditável. Ela, fechando os botões da blusa verde, com toda a naturalidade, lançando aquele olhar azulzinho de garota finalmente em paz com o próprio corpo, sorriu e disse:
– Muito prazer! A senhora é uma simpatia!
E lá se foi ela.
Deixo aos senhores Psicólogos de plantão, maiores interpretações para esse fenômeno. Eu não dou conta.
Glória Britho